sábado, 21 de março de 2020

Meu último post foi há mais ou menos três anos. Não adianta: sempre que o coração aperta, sempre que não dá mais pra aguentar um sentimento encarcerado, é ora de libertá-lo e dizer adeus mais uma vez ao Gulag. Imagino que o mundo inteiro esteja absolutamente fodido agora. O coronavírus tá aí, ralando com a vida do planeta todo. Se ficar preso em casa já não fosse ruim o bastante até pra alguém que, em geral, gosta de ficar em casa, há uma grande chance de eu perder a mulher da minha vida. E eu nem sei bem o motivo. Há quatro dias ela me pediu um tempo. Eu sei, ela foi cretina e o timing foi péssimo. Mas não a culpo. Não faz nem um ano fiz exatamente o mesmo. Ou quase, porque resolvi simplesmente terminar. Isso, naturalmente, revelou-se um erra crasso pra mim em pouquíssimo tempo. Tive sorte dela me aceitar de volta, ainda que, pra ser bem sincero, as coisas já não andassem bem naquele momento. Vou explicar o porquê. Lá por meados do ano passado, cada um de nós recebeu uma proposta de trabalho daquelas irrecusáveis. Ela, começando uma nova carreira. Eu, dando um passo importante na minha. O problema é que as propostas nos colocaram a aproximadamente 1500 quilômetros de distância um do outro. Ela, na capital federal. Eu, no interior do RS. Até aí tudo bem. Acertamos que eu ficaria no interior apenas por um tempo e que, passados alguns meses, iria também para a capital. Ela esperava muito isso de mim. Fazia planos e projeções para quando estivéssemos juntos. Eu também queria estar com ela, mas ao mesmo tempo, a ideia de deixar minha profissão e a pouca estabilidade recém alcançada me aterrorizavam. Ela sentiu a minha hesitação e o relacionamento esfriou. A distância, claro, não ajudou.

Aí veio o término. Ele durou mais ou menos 72 horas. Meu timing também foi péssimo. Tínhamos uma viagem marcada, mas eu estava tão angustiado com toda a nossa situação que não consegui evitar. Foi o final de semana mais miserável da minha vida. Quer dizer, o mais miserável até agora. É claro que o término deixou marcas bem profundas na gente. Eu me tornei um sujeito extremamente inseguro. Nunca fui o campeão da auto-estima, mas nada se compara à insegurança que tenho sentido nos últimos meses. Ela ficou, no mínimo, desconfiada em relação à gente. Mesmo assim, recolhemos os cacos e fizemos um novo acerto. Tentaríamos nos ver com mais frequência, fazer mais planos juntos. Funcionou por um tempo. Pelo menos eu acho que funcionou. Conseguimos passar algumas boas semanas juntos no verão. Hoje eu sei o quão difícil foi pra ela o mês inteiro em que estivemos morando juntos na capital. Apesar de eu estar em férias, estava longe do meu espaço. Entrar de supetão na vida brasiliense dela foi um desafio que eu não consegui vencer. Acho que devia ter me esforçado mais. Aí vieram feriados, carnaval, e eu achei que estava tudo bem. Mas parece que não estava. Confesso que já havia percebido alguns sinais de que algo não ia bem, mas deixei tudo de lado.

Em uma terça-feira, depois de um final de semana em família que antecedeu o início da quarentena, veio, de surpresa, o pedido de tempo. Uma semana. Falando assim, nem parece muito. Mas pra mim cada hora é o infinito. Agora só me resta esperar. Ainda tenho três dias de completo silêncio pela frente. Mas o que tínhamos, dado a distância, era voz. É como se tivessem tirado tudo de mim.